“… A gula não é um pecado! – é mais do que isso, é a própria pecaminação. A vida já é boa de mais para o que mereceríamos. Ou talvez exactamente igual, porque Deus é ciumento e temperamental mas gosta muito de nós, sabe-se lá porquê – porque nos fez, tinha de ser. Dentro dos ingredientes que são os pecados estabelecidos, a gula é a farinha; é o sal; é o açúcar… A gula sozinha tem pouca graça. É preciso juntar outros pecados. A avareza é um bom aperitivo: tal como o grande escritor inglês Evelyn Waugh, que depois de cinco anos de guerra comeu duas bananas inteiras à frente dos filhos famintos dos frutos dos trópicos, a “deliciosidade” de uma iguaria é directamente proporcional ao número de pessoas que podem usufruí-la. Quanto menos, melhor: mais saboroso. Não basta uma pessoa alambazar-se em excesso com uma coisa: é preciso que outros sofram por ausência dela. A saudade de outrem é o que falta ao apetite de quem não tem mais nada do que fazer senão poder comer e beber o que os outros não têm. A gula alia-se também, muito agradavelmente – como as amêndoas torradas à mais fresquinha das Manzanillas -, à preguiça. O sabor das coisas - sobretudo da gila e da luxúria – é muito beneficiado por não ir trabalhar. Por não ir fazer nada do que se deve - disse Pessoa. … A gula é uma espécie de Angostura Bitten dos outros pecados. Diz: “Sim!” Diz: “Sim! Quero mais do que me estava destinado!” Diz, simplesmente: “Então está bem.” … A gula é o único pecado que anula a inveja, provocando-a, A gula é rainha. Se houvesse só um pecado a reter – e que significasse o prazer e o agradecimento da vida – seria ela e mais ninguém. Ser-se “guloso”, na cultura portuguesa, é coisa boa. O resto é chorar sem razão alguma. … Ser-se guloso é querer mais. Mais é praticamente a única coisa que se pode ter. É bom ser-se guloso. Significa gratidão. É bom pecar por insatisfação. É bom pecar porque pecar é bom. A gula é a vontade de viver mais ainda e o querer “mais ainda” é sinal de que se tem vontade de viver. Mesmo assim. “Mesmo assim”: haverá melhor definição da gula?”
Excerto da crónica “Mais! Mais! Mais!” de Miguel Esteves Cardoso in Noticias Magazine 774
«O nosso novo produto não tem gorduras, colesterol, calorias, açúcar, sal ou conservantes. A caixa está vazia, mas é exactamente o que toda a gente quer...!»
Aqui, encontram um museu on-line sobre alimentos com formas estranhas, diferentes ou mesmo autênticas obras de arte, às quais ninguém fica indiferente. Assustem-se ou riam-se!
Sou a Ni, sou nutricionista e este é o meu blog. Aqui partilho a minha paixão pelo fabuloso mundo da nutrição. Dizem que este é o melhor blog sobre nutrição do mundo e arredores!